quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Complexidade da teoria do Peter Pan


Uma rapariga, de aproximadamente 5 anos, está sentada num poço, que dizem alguns, ser mágico, mas ela não o sabe. É bonita, Maria rapaz de aparência, usa calças de ganga larga, onde as extremidades estão sujas de lama, fruto de alguma brincadeira em poças proibidas pelos adultos, um dos joelhos está rasgado, talvez tenha subido a uma árvore para ver melhor o seu castelo de ar e vento, a camisola também está suja, de chocolate, a gulosa, no cabelo castanho claro, tem folhas secas, próprias da estação, é o que dá andar a construir castelos de folhas, o vento não gosta, e invade seus domínios, mas embora seu corpo mostre sinais de brincadeira, seus olhos apresentam tristeza, e uma gota grande e pesada pende dos seus olhos castanhos, e caí sem aviso na água límpida, mas ao mesmo tempo negra, do poço mágico, eis então que…
- Porque estás triste?
Por pouco a rapariga não caía dentro do poço, ao invés disso, caí para o chão, abismada pelo que vê, uma mulher, entre os 20 e 30 anos, bastante bonita, com um vestido negro, deixando a descoberto as costas bem desenhadas, sorri-lhe, está maquilhada, nota-se os traços efeminizados, usa brincos compridos e uma bonita pulseira em prata, com uma rosa desenhada numa medalha que desta pende, tem olhos negros e cabelos castanhos-escuros.
- Quem és tu? Que me queres? – Perguntou a rapariga assustada.
- Calma, eu sou tu, mas crescida, apareci pois estás sentada no poço dos desejos, e ao deixar cair a lágrima, pediste algo, o quê?
- Nada mais senão crescer, para me respeitarem – respondeu a inocente criança.
- É normal da idade, entre vós crianças, irá sempre haver desavenças.
- Estou farta que me critiquem, nada do que eu faça está correcto.
- Toda a tua vida haverá sempre alguém irá por as tuas ideias em questão.
- As outras meninas dizem que sou diferente, que pareço um rapaz…
- Isso mudará, com o passar dos anos, ficarás tão feminina como eu e ainda mais bonita. – E a mulher de modo doce, sorriu.
- Irei viver onde? Numa casa no campo, cheia de animais para brincar?
- Não, viverás num apartamento luxuoso, no centro da cidade.
- No centro da cidade? Mas isso é muito barulhento, e está sempre confusão, ao menos terei um cão?
- Não, mas terás uma televisão maior do que tu.
- Eu não quero nenhuma televisão maior do que eu, senão não consigo chegar aos botões. Que fazes durante o dia? Brincas? Jogas com os teus amigos? Comes bolo? Vês desenhos animados o dia todo?
- Não, nós trabalhamos, o dia todo, não temos tempo para essas coisas, o trabalho é muito importante, e duro, não tenho tempo para cozinhar, tenho dinheiro suficiente para ir todos os dias a um restaurante.
- Vais a que restaurante? Ao Mec? Os outros não gosto, só gosto da comida da minha mãe, ela começou ontem a ensinar-me a fazer feijoada, mas acho que me perdi na parte da cenoura e da chouriça.
- Não, não vamos ao “Mec” mas aos restaurantes 5 estrelas, dos melhores que há, e em casa, temos máquinas que lavam a roupa, a loiça, por nós e uma empregada que nos limpa o pó da casa.
- Mas eu gosto de limpar o pó, divirto-me a andar debaixo da cama. Esses restaurantes não valem nada, paga-se um balúrdio por uma colher de puré e uma coxa de coelho que só se vê os ossos, sem falar do homem com cara de mau que se põe atrás de mim a ver se como tudo, sim porque não vejo o que esteja a fazer, a não ser isso…
- Minha querida, és tão inocente, tens tanto para apreender, e descobrir, vais crescer, e tornar-te como eu, e vais gostar.
- Vou ter liberdade, e sair com os meus amigos todos, e como tenho uma casa assim tão boa, convido-os a viverem todos comigo, e assim seremos felizes para sempre, e faremos farras todos os dias. – ao dizer isto a criança sorria, de uma maneira inexplicável.
- Mas tens que trabalhar, não podes ter farras todos os dias.
- Hum está bem, fazemos só aos fim-de-semanas.
- Mas mesmo assim eu tenho a minha vida, a minha casa está organizada, não posso levar essa gente toda para lá…
- Está bem, eu resolvo o problema, eles ficam no quintal, sim porque se tu és eu, temos de ter um quintal, constrói-se uma enorme cabana, e depois subimos á árvore e cantamos como se fossemos macacos.
- Estás doida? Pareces uma selvagem, claro que não, quintal? Mandei destruir para construir uma garagem. Alem disso, tenho de tratar do meu menino.
- Menino? – Os olhos dela iluminaram-se – tens um bebé? Como se chama? E o pai? É aquele rapaz do segundo ano da turma do Henrique? Eu gosto dele vai para uma semana e meia, nunca gostei de alguém tanto tempo. 
- Aí miúda, tu dás cabo de mim, já não me ria tanto, há imenso tempo. O meu menino é o meu BMW, percebeste? E quanto ao pai? Meu Deus tenho mais que fazer do que me amarrar a um homem, são piores do que crianças, a maioria só se quer aproveitar de ti. O que fazemos, é seduzi-los e depois divertimo-nos com a capacidade inofensiva que cada um para se arrastar aos nossos pés, e quando nos cansarmos, mudamos de número de telemóvel. Já agora, que roupa é essa? Credo agora que reparo, os teus cabelos estão tão desgrenhados, pareces um rapaz a falar e estás toda suja, já não me lembrava de andar vestida assim. Porque andas assim? Não tens vergonha, é normal que nenhum rapaz goste de ti…
- Prefiro ser assim a ser igual a ti.
- O quê? O que estás a dizer? Miúda insolente.
- Posso não ter as tuas jóias, mas não penso como tu.
- Ah? Explica-te, o que queres dizer?
- Prefiro ser criança, para sempre, e não crescer. Prefiro ficar assim, a ser como tu, és fútil, não tens cão, és aborrecida, bonita, mas egoísta, só pensas em ti, apenas vives para o trabalho, és adepta do menor esforço, e duvido muito que tenhas amigos.
-É claro que tenho amigos, isso nem se pergunta.
-Quem? Nomeia-mos!
- Bem, tenho o… a… quer dizer… assim de repente… hum… dá-me tempo… eu vou me lembrar… mas…
- Vês? Esqueceste-te da quão aventureira podes ser, da adrenalina que sentes quando sobes a uma árvore, do sabor do vento, da água que acaricia a tua pele, de um por do Sol ao lado dos teus amigos, eu não quero crescer, quero ficar assim, e ser feliz, com a minha inocência, com a minha ignorância, mas continuar a ser divertida.
- Não faças isso, não sabes o que vais perder, o Mundo fantástico ao teu redor, onde tudo o que desejas se realiza, posso não ter amigos mas tenho o resto, nada material me falta.
- Tudo o que desejo é ser feliz, e tu alteras-te esse sonho, tu és uma mulher sem sonhos, tenho pena de ti de que serve ter tudo o que desejas se nem tempo tens para o gozar, de que serve ter uma casa luxuosa senão a podes dividir com ninguém, não quero crescer, mas se crescer de certeza que não vou ser como tu...
E com isto a menina foi embora, correu para os amigos que a procuravam, a mulher caiu no chão e as lágrimas correram, correram de tal modo, que dali se fez a fonte do poço.
A menina cresceu, mas optou pelo mesmo caminho com ideias diferentes, não perdeu os amigos, teve 3 bonitos filhos e foi feliz, e um dia, um dia destes, visitou a fonte, mas esse texto, é uma outra história… J

1 comentário:

  1. Fantástico, adorei a história, estou morta de curiosidade para saber o que acontece ao filhote dela... Excelente querida, continua.
    Nunca pensei em discutir comigo mesma, muito bom mesmo, imagina eu a discutir com a Joana do Futuro. Espero que não seja uma coisa parecida.
    Ou se calhar é, quem sabe.
    Beijinhos

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